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Mensagens

A mostrar mensagens de agosto, 2020

Tonturas

 Pressa! Tenho pressa de correr à frente do tempo. O coração acelera como se a maratona já tivesse começado há horas e eu cheguei atrasada. Sou o coelho da Alice que aparvalhado corre, subjugado ao relógio que não pára... Tonturas. "Não tenhas pressa!" - ouço. Desacelera o passo que te atrapalha e usufrui do agora. Amanhã, talvez, não chegue nunca. Amanhã é só um advérbio temporal e ficcional... Habituámo-nos à roda-gigante e deixou de ser  um joguete humano. Transformou-se em roda da vida, roda da fortuna, roda-dos- altos-coices, roda dura de roer, roda enguiçada,  e a vida passou a ser uma roda viva. E enlouquecidos furamos caminho como se o futuro fosse o mais importante. "Não páres! É tarde! É tarde!" Roleta-russa que acabará por te matar.  "Olá! Adeus!" E a vida é esse adeus. Um aceno que se dilui na memória do tempo que continua a girar. (Celina Seabra)

Quiçá

 Melhor seria ter coragem para partir e trilhar caminhos separados dos teus. Talvez precise de olhar só para as minhas pegadas sem pensar que outras seguem a meu lado. Quiçá precise de me achar a sós com os meus pensamentos e o turbilhão em que se encontram. Perdi o fio para os desenlaçar e a imagem é surreal. Porventura, perdi-me há muito tempo nesse caminho feito de melancolia e abismos. Preciso de recomeçar. Preciso de um reencontro a uma só alma:  a minha. Quiça consiga a proeza de me reconciliar comigo mesma. (Celina Seabra)

Desencontros

  Um mesmo mar e duas embarcações - somos assim. Remamos tantas vezes em correntes contrárias que até já lhes perdi a conta! Eu sou a tempestade, o vendaval que sacode o meu e o teu  barco. Eu sou o trovão destruidor que ilumina a noite que se torna medonha! Sou a Destruição. Tu manejas a tua embarcação e usas o arpão para ludibriar a fera. Não temes seres abocanhado. "Muito roncar e pouco fazer" - sabes que assim é. E "pela boca morre o peixe." A tempestade passa. Foi-se a rebentação. Ficam as palavras loucas, os relâmpagos secos que destroem, queimam, incendeiam... Mas desce sobre o nosso mar a acalmia. As canoas reencontram-se de novo, Até quando, ainda não sei. (Celina Seabra)

Loucura

Foi-se embora a minha Loucura. Ontem era prisioneira sua. Hoje, liberta das suas garras que me amedrontam, caminho dentro da Razão. Temo a fera que se aninha inexplicavelmente dentro de mim. Ocupa um território que é meu e que desocupo porque me destrona. Temo as suas depressões, as suas fúrias repentinas, o seu masoquismo que me flagela a consciência. Deixo de ser eu, sem deixar de o ser, porque não lhe consigo escapar. E magoa-me o entendimento. E dói, dói e cresce a vontade de sacrificar-me. Todo o heroísmo passa por imolar no altar da vida a insensatez de passar o impossível. Minha Loucura arrasta no seu manto as minhas ansiedades, os meus gritos mudos, as minhas revoltas por vingar, as minhas paranóias e a minha diferença… Não me dou conta e abro-lhe a porta, como se acordasse e abrisse repentinamente os olhos para o dia que só começou porque me consciencializei do seu início. Ocupa todos os meus compartimentos e eu fico pequena para albergar a Loucura que mora...