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Loucura

Foi-se embora a minha Loucura.

Ontem era prisioneira sua.

Hoje, liberta das suas garras que me amedrontam, caminho dentro da Razão.

Temo a fera que se aninha inexplicavelmente dentro de mim.

Ocupa um território que é meu e que desocupo porque me destrona.

Temo as suas depressões, as suas fúrias repentinas, o seu masoquismo que me flagela a consciência.

Deixo de ser eu, sem deixar de o ser, porque não lhe consigo escapar.

E magoa-me o entendimento. E dói, dói e cresce a vontade de sacrificar-me.

Todo o heroísmo passa por imolar no altar da vida a insensatez de passar o impossível.

Minha Loucura arrasta no seu manto as minhas ansiedades, os meus gritos mudos, as minhas revoltas por vingar, as minhas paranóias e a minha diferença…

Não me dou conta e abro-lhe a porta, como se acordasse e abrisse repentinamente os olhos para o dia que só começou porque me consciencializei do seu início. Ocupa todos os meus compartimentos e eu fico pequena para albergar a Loucura que mora em mim.

Bendita as lágrimas que se libertam e lavam as paredes que me sufocam! Aos poucos aliviam a pressão e a psicose esvai-se como se de uma fantasia se tratasse.

Deixou no seu lugar a Tranquilidade que me repõe sã.

A loucura foi-se, tal como chegou: inexplicavelmente.

Agora sou Normalidade.

(Celina Seabra)

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