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Palavras

Está tudo feito.
Já tudo foi dito. 
Já de tudo se escreveu.
As palavras surgiram. Primeiro sons, depois pequenas formas de dizer, de chamar, de compreender, de amar e até de ofender.
As palavras tornaram-se um mar.
Algumas mergulharam num abismo e não têm retorno. 
Outras encontraram terra onde ficar. Alguém, um dia, se lembrará de as ir repescar.
À tona navegam uma infinitude de termos. 
Alguns debatem-se pela sobrevivência. Não querem passar à imersão. Combatem pela sua difusão.
Outros acotovelam-se entre a concorrência.  Querem marcar presença. 
E aquelas que longe dos comuns invulgares se mantinham, aproximam-se para não se transformarem, em ilhas. Usam luvas de pelica. O cheiro fétido da vulgaridade incomoda-as. É que o Calão,  que dentro da hierarquia se situava no mais baixo escalão, vê a oportunidade chegar e em popular se tornar.
Hoje o ensino não cativa, aborrece.
As palavras que são a nossa pátria ficam esquecidas para serem substituídas por smiles, gifs...
É o tempo da imagem, do pensamento volante, de tudo ser feito num instante.
As palavras exigem pensamento e este cansa.
Trabalhá-las exige ser artesão e essa profissão há muito que entrou em extinção.
Amar as palavras, exige entrega, paixão, comunhão, e p´ra isso não há tempo, não!
O tempo redopia sôfrego,
 entrou-se na era da energia, da embolia, da combustão.
As palavras atrofiam-se, adoecem e envelhecem...
Está tudo inventado.
Falar bem, é hoje, inapropriado.
Está na moda ser iletrado!


( Celina Seabra)


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