- Encosta a porta! Não deixes entrar a madrugada de Outono! Observo o que pouco se vislumbra. A porta está aberta e Ela já começou a entrar. É enorme! As sua saia volumosa ocupa quase todo o espaço e traz mistério. Quero olhá-la nos olhos, mas não os encontro. São fugidios, quase tímidos. As estrelas apagaram-se e deixaram uma madrugada cinzenta, ainda muito vestida de carvão. Parece trazer consigo os pesadelos do mundo. Ocupou a minha alma e está mais pesada. Não gosto, porque sabe-me a tristeza e eu quero - a dali p'ra fora. Recuo. Agora só somos toque, paradas à frente uma da outra. Os seus olhos são pontinhos de mendiga. Está só. Abri-lhe a porta e ela entrou, mas não é perscrutadora nem exigente. O seu traje enorme, de dama antiga desmazelada, incute cautela. Toda ela é mistério e está sedenta para encontrar uma amiga e narrar as suas histórias. Mas a mim sabem a mistério, mágoa e solidão. Quero uma madrugada rósea, primaveril, com trinados de pássaros e zumbidos de insetos. ...